domingo, 26 de setembro de 2010



Só o que eu tenho é isto mesmo. A chuva caindo lá fora, a janela entreaberta , alguns carros passando na rua, e um noite triste de domingo. Entretanto, nada me podia ser mais agradável. Pois sei que amanhã é Natal. Depois de mais um longo ano, eu sei que faltam poucas horas pra eu sentir de novo tão perto o espírito dele. Sentir o corpo, o cheiro, a textura da pele, a respiração. Aquele modo de existir que me conquistou por inteiro ao longo de muitas vidas.Será apenas um abraço, eu sei, um tempo que passa tão rápido dentro da eternidade de um ano em que se espera por isso. No começo eu achei que essa idéia fosse bobagem. Ele também me advertiu disso. Disse que eu iria sofrer, que seria pior. Mesmo assim eu insisti. Quantos sofrimentos há na vida , e tantos, todos os dias. Me propus a aceitar um que pudesse me trazer não a completa felicidade, mas ao menos a lembrança do que aconteceu naqueles dias de verão. Estou ao mesmo tempo ansioso, porém sereno, dedilhando entre meus sentimentos aqueles forem mais verdadeiros e belos para serem exprimidos em palavras. Não sei se ele me deixará falar muito. Toda vez que entro em assuntos sobre o passado ele logo se queixa e pede com educação que eu me cale. Eu aceito. Faz tempo que nós não nos falamos. Eu mesmo escolhi assim. Evitar todo o sofrimento de ser recusado vezes e vezes e substitui-lo pela mágica de um só dia, um só momento. Não sei se quero dormir, eu penso tanto em como eu quero que esta hora chegue que as vezes chego a pensar que meu coração se incomoda comigo e quer fugir. Que há sempre um duelo de forças internas, uma briga entre o que eu devo pensar o que eu devo realmente fazer. É quando eu paro, e tento não pensar em nada. Tento voltar-me mais uma vez pro vazio e para a paz que existe em algum lugar dentro do meu coração. E quando eu consigo isso, eu só ouço a chuva caindo lá fora. Quisera eu que o mundo fosse apenas isso; O silêncio do meu quarto, e a chuva caindo lá fora. E mesmo nesse momento, em que nada mais parece existir, é que eu me lembro dele de novo. Agente sempre gostava de sair aos domingos , pra ir ao cinema ou tomar sorvete. Era rotina, mas quando chovia ele sempre mudava os planos. O Rafael gostava de chuva, gostava de se molhar e ver como as pessoas se importavam com o fato de como nós simplesmente não nos importávamos. Ele dizia que eu ficava mais bonito com os cabelos molhados . E gostava de enxugar meu rosto com as pontas dos dedos, dizendo coisas no meu ouvido. As mesmas bobagens que sempre me faziam rir. Dizia também que gostava da chuva só quando estava comigo, que era pra poder beber a água que escorria dos meus lábios gelados. Eu sempre me perco nesses pensamentos e fico lembrando da gente voltando pra casa. Eu podia ler nos pensamentos dele. Nós sempre voltamos rápido,não porque estava chovendo, mas porque ele queria ficar logo sozinho comigo. Chegávamos na casa dele, e se já era bem tarde ele subia as escadas, tirando a minha roupa, abria a porta do apartamento e deixava ligada apenas uma lâmpadazinha fraca, amarela da cor do por do sol. Tudo que havia era um jogo de luz, sombras e o desenho dos nossos corpos se amando projetado na parede. Toda a atmosfera do lugar se cobria de um efeito mágico e singular .Ele me deitava devagarzinho no sofá da sala enquanto me beijava o corpo todo, e eu ia devagar tirando a roupa dele. Primeiro desabotoando a camisa, sempre assim, uma peça de cada vez.Cada botão que eu abria deixava a mostra um homem de peitoral largo, da pele morena, de braços fortes e um corpo queimando de vontade de amor. Tudo isso contrastava com a doçura que eu via naqueles olhos, na sutileza de cada toque. Eu sentia que cada beijo dele era uma forma de dizer " eu te amo" e que cada respiração sincronizada com a minha era uma maneira de me proteger e estar sempre ao meu lado. Ele sabia vários modos de me agradar, e antes de sairmos de casa já deixava no som a minha música preferida. Não precisava de mais nada no mundo. Estar entre aqueles braços era uma forma de me encontrar com Deus . Estar próximo do amor verdadeiro e incondicional. Ficávamos ali por muito tempo, perdidos uns nos olhos do outro, trocando carinhos e palavras. Até que eu dormia e ele me pegava nos braços e me levava pro quarto dele. Eu podia levantar e ir sozinho, mas ele dizia que preferia não me acordar. No silêncio do quarto, mesmo com sono e com os olhos já cerrados, eu podia sentir a respiração dele. E pelas batidas do seu coração, podia perceber que ele estava sorrindo ao me ver dormir