terça-feira, 5 de novembro de 2013

Espelho





" Será mesmo, que a gente tem que vir pro outro lado do mundo,

  pra aprende a amar o sol brilhando, no verde do quintal de casa !? "

                                                                                               Eu, em um momento de lucidez.



Tenho escrito muitos poemas em linha reta,
mas a verticalidade das ideias deles me deprime.
E agora, por falta de ousadia (ou necessidade) ,
eu simplesmente escrevo do modo que escreveram sempre.
E nem me importo que me julguem por copiar o estilo de Drummond ou Pessoa.
O que tiver se ser, será.
(...)
Hoje me olhei no espelho,
e vi comigo a Terra toda, e todas as imagens projetadas nessa tela que não se diz o nome,
mas que existe,
e não muito se entende,
e cuja projeção alucinada de ideias e imagens e sons nos separa da paz.
Nada mais do que a verdade.
Quem sou Eu ? Deus existe ? O que nós estamos fazendo aqui ?
Não me chamem poeta. Apenas Penso.
Átomos refletidos das estrelas, quem somos nós afinal?
Um ponto de vida pulsando no emaranhado infinito ( da vida !?)
Mas o que é a vida senão nós mesmos tentando entender a vida.
Criatura que se projeta, como um olho gigante e atrevido, sobre a mão desenhante do seu criador.
E que para depois do instante em que isso foi pensado não mais se concebe,
nem criador, nem criatura,
mas apenas uma sopa primordial onde todas estas angústias se aglomeram.
O que sou eu ? O que será de mim ? Porque continuar ?
Quisera eu ser ignorante e belo como as criaturas que existem sem pensar nisso.
Como os cães que circulam nas praças ou os pombos que constroem seus ninhos nos telhados das igrejas.
Mas eu existo.
Eu continuo.
Mesmo sem (as vezes) querer.
Ajudar a humanidade? Ser bom? Aprender o amor?
Mas pra onde é que vai a humanidade que precisa de ajuda?
E o que é ser bom?
Existe amor?
Fisicamente tudo se explica. A precisão do método gera uma resposta para qualquer questão por mais
subjetiva que seja.
Mas nada explica essa dor, esse pesar, esse cansaço.
A datilografia rápida desses versos buscando dar uma explicação palpável, plausível e concreta para o que é o fenômeno da vida.
Para o que é o fenômeno da vida? Mas que atrevimento !
Cala essa boca menino !
E eu vejo uma velha sentada numa cadeira gigante, e eu pequenininho aqui em baixo.
Essa velha gorda, feia e mal educada.
Com uma verruga peluda na cara e uma testa enrugada de quem nunca foi de verdade feliz.
Cala essa boca menino ! A velha repete.
Eu não me importo.
A velha gorda vive, e sempre há de viver no canto empoeirado da minha angústia.
Eu a chamo Religião, e procuro não pensar muito nesse fato um pouco maçante que é a sua existência.
Mas não me incomoda muito.
Coisas nitidamente ridículas precisam ser ignoradas.
Mas não é por isso que eu me calo.
É uma certa questão de respeito.
Atrever-se a pensar no que é o fenômeno da vida é tão absurdo quanto um pecador ousar pedir conselhos a Deus.
Uma gota de sarcasmo escorre-se-me pelo canto do lábio.
Limpemo-na.
Mas sobre o que é que eu estava falando ?
Deus?
Ah Sim, Deus.
É a coisa mais ingênua que eu já vi os homens criarem.
Os homens criam muitas coisas, vós sabeis.
Algumas são estúpidas, outras ingênuas, e outras, poucas, mas muito poucas são brilhantes,
mas não convém falarmos sobre isto agora.

"Pára meu coração, não penses, deixa o pensar na cabeça..."

Trinta e seis minutos.
É o tempo que eu tenho até que este poema seja finalizado.
Depois disso um sono de 8 horas seguirá.
Todas as minhas funções metabólicas e fisiológicas se cumprirão para recuperar a máquina na qual estou inserido.
E que há de morrer um dia. Graças a um deus qualquer, mesmo que ele não exista, que é uma, dentre das muitas possibilidades.
8 horas serão suficientes para recomeçar um ciclo completo de outras 24 horas onde tudo se repete e nada muda.
Os transeuntes mudos se diluindo nas multidões,
O chão coberto de neve,
O burburinho de todos as manhãs se amontoa e o dia,
O dia,
Ah, meu Deus, o Dia,
Como uma manada de animais no cio, o Dia recomeça.
Sem que ninguém pergunte por causas e explicações.
Num silêncio mudo e estúpido.
Onde só há voz dentro de mim.
E em lugar mais nenhum.
Pensar nisto dói.
Mas também liberta.

Essas palavras nunca vão explicar as ambições do meu pensamento,
minhas questões mais incômodas, e secretas, e profundas.
Mas,
perguntá-las,
dar vida aos meus questionamentos exalta o meu ego sobre uma suposta inteligência de investigar o que é o mundo.
Não,
Não hoje.
Vinte e nove minutos não me trarão o tempo de respostas sobre a jornada do homem na Terra.

Mas o sol morrendo no gramado lá de casa,
Os primos todos reunidos,
O burburinho das tias velhas falando de saudades,
E os meus olhos quase se derramando de olhar pra tudo aquilo,
sem nada perguntar,
sem nada pensar,
e nem pretensões de entender coisa alguma.
Apenas o sol e o gramado lá de casa,
Lembrar que isso existe,
responde muita coisa,
mesmo sem haver nenhuma pergunta.



Yuri Volpato Santos , Canadá, 00:04 , 06 de Novembro de 2013