domingo, 27 de setembro de 2009



“ Eu ia me consumindo lentamente com a espera daquela viagem; além do vidro, as árvores passavam rápidas e iam deixando os rastros , em verdes manchas, das minhas memórias, dos meus pensamentos, idéias diluídas no meu calendário de horas... Eu não sabia o que me esperara para o final daquela estrada.Talvez fosse apenas mais um menino, como eram todos os outros, talvez fosse mais que isso... Muito me agradara nossos pequenos diálogos , por intermédio das letras ou mesmo de nossas vozes; faço por crer que nutria alguma esperança naquele encontro , mas busquei não pensar em tais circunstâncias, que era para não quebrar o nostálgico protocolo das expectativas... Sentado ali, a esperar, eu me divertia com as formas que tomavam as nuvens enquanto o ônibus ganhava a estrada... sobre as planícies banhadas de luz, elas dançavam...Imersas num véu de amor, delineavam em doces traços a ciranda dos anjos e das fadas; se avolumavam e depois se desfaziam , então eram densas e outrora dispersas, uma alternância itinerante entre sonhos e realidade. Eu me lembro de como me divertia ao perder meu olhar no infinito daquelas planícies, por aquelas horas da tarde , quando o sol as toca muito levemente , e com seu banho de prazer , as embriaga em uma luxúria de pecado e poesia...
Busquei dormir , mas o sono não veio... busquei distrair-me, dialogar com idéias passadas, tentativas em vão ... Eu desejava sentir aquele corpo que eu nem mesmo conhecia , eu desejava ser penetrado por aquela voz , levemente roçando a superfície inerte dos meus desejos ... mergulhar com ele em profundas piscinas de prazer, cujas águas muito quentes, fossem, como ele, possuindo todo meu corpo...até me fazer adormecer nos mais belos sonhos de um amor irreal...
O tempo passou, mas ele não veio, a cidade se aproximava e com ela minha ânsia por aquele encontro; minhas mãos suavam, meu corpo tremia , eu era todo um erro, um desarranjo entre meu acordo de sentidos, meu repertório de palavras... Eu era uma fruta madura, de doce e de suco, esperando pelos lábios dele... Foi quando eu cheguei ; e após algum tempo de espera , ele veio também...
Não era um menino, não era um homem. Era uma sensação, uma orgia frenética de desejos se movendo sobre passos. Lentos, ritmados e uniformes. Enquanto ele ia, toda a realidade, dispersa em neblina e fumaça, ficava por trás do seu rastro. Meus olhos, minha mente, meus sentidos todos se confundiam, se entrelaçavam e se embebiam do éter que escorria daquele prazer... Quando olhei, todas as palavras me escaparam da boca como areia pelos dedos, como perfume disperso no ar. Queria um só adjetivo ou verso talvez pra derramar sobre o sorriso daqueles lábios que iam me consumindo com o fogo de todas as minhas vontades proibidas. Os meus olhos beijavam a luz que transcendia dos olhos dele e toda a minha alma se debruçava sobre as janelas dos meus sonhos só pra ver ele sorrir . De suas pupilas emanavam o castanho e o mel que se derramavam por todo seu corpo . E os cabelos, muito negros e de um volume muito vivo , vertiam-lhe pelo rosto em cascata, cobrindo-o de beijos muito aéreos e surreais...Todo o corpo dele era um convite, uma provocação irrecusável a um derramamento súbito de carícias...um jorrar de paixões avassaladoras, uma vontade incontrolável de me perder para sempre naqueles braços...Como um pincel sobre a tela branca, a beleza de sua existência tentadora tangia contornos vários pelo rosto iluminado...Resvalando pelas costas , afagando-lhe o peito e o flanco , tangenciando com beijos de nuvens os traços que brincavam, como anjos meninos, com as harmonias diversas que circundavam aqueles olhos.



Queria eu ser apenas uma linha , um traço, um feixe de luz que fecundasse o desenho de tão lindos olhos , que penetrasse por um segundo no mistério daqueles dois segredos que eu tanto queria desvendar...


Ele não era um homem , era quase que um sentimento , uma vontade . Uma ebulição de sensações desconexas em efervescência espiritualizadas em alma e matéria...

Ele era a própria volúpia olhando pra mim , e eu era o desejo olhando pra ele...”

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